Por que Estamos Deixando de Postar nas Redes Sociais? Entenda a Tendência de “Postagens Zero”

Após duas décadas de crescimento desenfreado no compartilhamento online, uma nova e curiosa tendência está emergindo: as pessoas estão postando menos nas redes sociais. Pesquisas recentes indicam que cerca de um terço dos usuários está reduzindo sua frequência de postagens, e essa mudança é especialmente notável entre os adultos da Geração Z.

Essa transição, que pode parecer sutil, levanta a questão: o que acontece com nossas vidas digitais quando as redes sociais se tornam menos sociais? O escritor Kyle Chayka, autor do livro Filterworld, desvenda esse fenômeno que ele chama de “postagens zero” e nos convida a uma reflexão profunda sobre a natureza da nossa interação online.

A Transformação das Redes Sociais: De Diário Pessoal a Conteúdo Genérico

O principal motivo para a queda de postagens pessoais é uma mudança fundamental na natureza das plataformas. Kyle Chayka, que observou essa transformação em seus próprios feeds, compara o cenário atual a uma televisão, onde o consumo passivo de conteúdo substituiu a interação genuína. As redes sociais, que antes pareciam uma cópia imperfeita da nossa vida social, hoje se assemelham a um “conteúdo” como outro qualquer.

O feed, antes preenchido com fotos de amigos, se tornou dominado por anúncios de marcas, fast fashion e influenciadores. A vida cotidiana e as postagens orgânicas do usuário comum se perdem em meio a esse “lixo impessoal e genérico” que os algoritmos entregam. A promessa de que as plataformas nos conectariam com amigos e familiares deu lugar a um modelo de negócio focado em manter o usuário engajado para consumir anúncios. Como Chayka aponta, os algoritmos são “assustadoramente poderosos” em nos guiar por coleções infinitas de vídeos, tornando a experiência mais passiva e menos social.

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O Declínio da Exposição Pública e o Resgate da Privacidade

A tendência de “postagens zero” reflete uma percepção crescente de que as desvantagens de postar online superam as vantagens. O contrato social original das redes, que prometia visibilidade em massa em troca de conteúdo, não é mais atraente para o usuário comum. Os riscos de exposição pública se tornaram grandes demais. Pessoas, especialmente a Geração Z, aprenderam as desvantagens de expor a vida privada, como o risco de vergonha pública, a viralização por motivos errados e o assédio de haters.

O compartilhamento pessoal, contudo, não desapareceu, mas migrou para espaços mais íntimos e privados, como mensagens diretas e grupos de bate-papo. Kyle Chayka argumenta que essa mudança é uma prova de que a necessidade de uma rede social íntima e segura, onde se pode ser quem se é sem medo de julgamento, é uma demanda real. O WhatsApp, por exemplo, se tornou um reflexo mais fiel da vida social do que o Instagram ou o Facebook.


IA e o Futuro das Interações: Mais Conteúdo, Menos Autenticidade

Outro fator crucial nessa equação é o avanço acelerado da Inteligência Artificial (IA). Chayka observa que as empresas de redes sociais podem estar apostando que o conteúdo gerado por humanos será gradualmente substituído por material produzido por IA. Esse conteúdo, que é infinito e barato, pode ser usado para manter os usuários engajados, mesmo que a autenticidade e a relevância pessoal diminuam.

O escritor prevê que a nossa interação com os celulares será mais parecida com a televisão, com a fusão de plataformas como YouTube, TikTok e Netflix criando uma “combinação diabólica de áudio, vídeo e algoritmos”. Essa fusão resultará em um futuro onde as conversas e o aspecto social estarão em mensagens de texto ou, idealmente, se moverão mais em direção à vida real.

Essa transição, no entanto, traz um ponto de esperança. O pico da exposição em redes sociais pode ter nos feito redescobrir o valor de interações e compartilhamentos na vida real. A tendência de “postagens zero” pode ser um reconhecimento dos danos causados pela exposição excessiva e um passo em direção a um equilíbrio mais saudável. Como Chayka conclui: “Talvez as redes sociais fossem, de certa forma, essa aberração ou fuga. E essa ideia de que toda pessoa normal deve compartilhar sua vida em público era meio que falsa desde o princípio. Agora, estamos acordando um pouco e vendo os danos que aquilo causou.”

Fonte: BBC Brasil

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